sábado, 27 de julho de 2013

"Olho as minhas mãos que batem infatigavelmente os teclados da máquina de escrever. Penso em meus olhos que estão cada vez mais desbotados - eles que foram muito verdes - e imagino como tem sido grande minha luta, tão persistente em dificuldades é a minha vida. Mas foi este o caminho que escolhi, e por isso sinto uma bruta vontade de rir, de achar graça, já que devo esperar mais tempo, confiar sempre no futuro". (p. 176-177)

Eneida de Moraes. Argumentos para um filme. In: Aruanda. 
"- Qual a melhor etapa de tua vida?
- Todas, todas. Não perdi um minuto; vivi intensamente todas as minhas horas. Não tenho saudades especiais, apenas cultivo certas lembranças e lições e experiências".

Eneida de Moraes. Pé de Cachimbo. In: Aruanda. 

sexta-feira, 26 de julho de 2013


"Mas talvez, você não entenda
Essa coisa de fazer o mundo acreditar
Que meu amor, não será passageiro..."
"Suspenso entre dois encontros, tu caminharias desencontrado. Como se fosse para sempre, pesado, os ombros curvos, esmagados pela solidão". 


Caio F. Abreu. Ponto de Fuga. In: Caio 3D. 
"O sol rompeu as nuvens e os pequenos brilhos que cintilavam sobre as águas eram foguinhos acendendo e apagando". 



Clarice Lispector. In. Perto do coração selvagem
"Tudo o que não sou não pode me interessar, há impossibilidade de ser além do que se é - no entanto eu me ultrapasso mesmo sem o delírio, sou mais do que eu quase normalmente-; tenho um corpo e tudo o que eu fizer é continuação de meu começo; [...] aceito tudo o que vem de mim porque não tenho conhecimento das causas e é possível que esteja pisando no vital sem saber; é essa a minha maior humildade". 

Clarice Lispector. In: Perto do Coração Selvagem

sexta-feira, 12 de julho de 2013


A HILDA HILST

POA, 29.12.70

Hildinha, a carta para você já estava escrita, mas aconteceu agora de noite um negócio tão genial que vou escrever mais um pouco. Depois que escrevi para você fui ler o jornal de hoje: havia uma notícia dizendo que Clarice Lispector estaria autografando seus livros numa televisão, à noite. Jantei e saí ventando. Cheguei lá timidíssimo, lógico. Vi uma mulher linda e estranhíssima num canto, toda de preto, com um clima de tristeza e santidade ao mesmo tempo, absolutamente incrível. Era ela. Me aproximei, dei os livros para ela autografar e entreguei o meu Inventário. Ia saindo quando um dos escritores vagamente bichona que paparicava em torno dela inventou de me conhecer e apresentar. Ela sorriu novamente e eu fiquei por ali olhando. De repente fiquei supernervoso e sai para o corredor. Ia indo embora quando (veja que GLÓRIA) ela saiu na porta e me chamou: – “Fica comigo.” Fiquei. Conversamos um pouco. De repente ela me olhou e disse que me achava muito bonito, parecido com Cristo. Tive 33 orgasmos consecutivos. Depois falamos sobre Nélida (que está nos States) e você. Falei que havia recebido teu livro hoje, e ela disse que tinha muita vontade de ler, porque a Nélida havia falado entusiasticamente sobre Lázaro. Aí, como eu tinha aquele outro exemplar que você me mandou na bolsa, resolvi dar a ela. Disse que vai ler com carinho. Por fim me deu o endereço e telefone dela no Rio, pedindo que eu a procurasse agora quando for. Saí de lá meio bobo com tudo, ainda estou numa espécie de transe, acho que nem vou conseguir dormir. Ela é demais estranha. Sua mão direita está toda queimada, ficaram apenas dois pedaços do médio e do indicador, os outros não têm unhas. Uma coisa dolorosa. Tem manchas de queimadura por todo o corpo, menos no rosto, onde fez plástica. Perdeu todo o cabelo no incêndio: usa uma peruca de um loiro escuro. Ela é exatamente como os seus livros: transmite uma sensação estranha, de uma sabedoria e uma amargura impressionantes. É lenta e quase não fala. Tem olhos hipnóticos, quase diabólicos. E a gente sente que ela não espera mais nada de nada nem de ninguém, que está absolutamente sozinha e numa altura tal que ninguém jamais conseguiria alcançá-la. Muita gente deve achá-la antipaticíssima, mas eu achei linda, profunda, estranha, perigosa. É impossível sentir-se à vontade perto dela, não porque sua presença seja desagradável, mas porque a gente pressente que ela está sempre sabendo exatamente o que se passa ao seu redor. Talvez eu esteja fantasiando, sei lá. Mas a impressão foi fortíssima, nunca ninguém tinha me perturbado tanto. Acho que mesmo que ela não fosse Clarice Lispector eu sentiria a mesma coisa. Por incrível que pareça, voltei de lá com febre e taquicardia. Vê que estranho. Sinto que as coisas vão mudar radicalmente para mim – teu livro e Clarice Lispector num mesmo dia são, fora de dúvida, um presságio. Fico por aqui, já é muito tarde. Um grande beijo do teu

Caio Fernando Abreu 

Caio F. Abreu. In: Caio 3D: O Essencial da Década de 70.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

"Depois de todas as tempestades e naufrágios, o que fica de mim em mim é cada vez mais essencial e verdadeiro." (p.200)


Caio Fernando Abreu. Lixo e purpurina. In: Caio 3D: O essencial da década de 70.

"Estará sentado durante o dia nas bibliotecas e, de noite, nas tabernas ou jazerá estendido sobre um sofá alugado, ouvindo viver por trás das janelas o mundo e os homens, dos quais se sente excluído, mas não se mata porque um resquício de fé lhe diz que esse sofrimento, essa triste dor terá de ser sorvida até o fim em seu coração e desse sofrimento é que lhe virá a morte".

Hermann Hesse. In: O Lobo na Estepe
"Chorar por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, pelo que perdi de mim, pelo muito que amei e não me amaram, pelo que tentei ser correto e não foram comigo. Tenho vontade de gritar essa dor é só minha, de pedir que me deixem em paz com ela, como um cão com seu osso". (p.202)

Caio Fernando Abreu. Lixo e purpurina. In: Caio 3D: O essencial da década de 70.

"Juntou todos os seus pedaços e não procurou mais as pessoas. Reencontrou a janela onde se instalava em companhia de si mesma. E agora, mais do que sempre, nunca se vira uma coisa ou uma criatura mais feliz e mais completa... nada do que diziam lhe importava, e tudo deslizava sobre ela e ia perder-se em águas outras que não as interiores". (p.89)

Clarice Lispector. In: Perto do Coração Selvagem

segunda-feira, 8 de julho de 2013



"Arde em mim um selvagem anseio de sensações fortes, um ardor pela vida desregrada, baixa, normal e estéril, bem como um desejo louco de destruir algo, seja um armazém ou uma catedral, ou a mim mesmo. Ou de torcer o pescoço de algum defensor da ordem e da Lei".

Hermann Hesse. O Lobo na Estepe.  
"[Apesar] de sua atual figura triste e repulsiva, era membro da família e não podia ser tratado como um inimigo, mas diante do qual o mandamento do dever familiar impunha engolir a repugnância e suportar, suportar e nada mais"



- Franz Kafka. In: Metamorfose