quarta-feira, 28 de agosto de 2013

"Sim, sim, foi isso, não fugir de mim, não fugir da minha letra, como é leve e horrível, teia de aranha, não fugir de meus defeitos, meus defeitos, eu vos adoro, minhas qualidades são tão pequenas, iguais às dos outros homens, meus defeitos, meu lado negativo é belo e côncavo como um abismo". (p.135)

Clarice Lispector. In: Perto do Coração Selvagem
"Meu coração vai batendo devagar como uma borboleta suja sobre este jardim de trapos esgarçados em cuja malha se prendem e se perdem os restos coloridos da vida que se leva. Vida? Bem, seja lá o que for isto que temos..."

Caio F. Abreu. Luxo e Purpurina. In: Caio 3D.
"Não sabia que o mundo era assim duro, sujo. Agora sei. Tenho apenas essa consciência, que só a loucura ou uma lavagem cerebral poderiam turvar. Sobrevivo os dias à morte de mim mesmo. Sinto como uma virilidade correndo no sangue".

Caio F. Abreu. Luxo e Purpurina. In: Caio 3D.

"Claro que o dia de amanhã cuidará do dia de amanhã e tudo chegará no tempo exato. Mas e o dia de hoje?"

Caio Fernando Abreu. Luxo e Purpurina. In: Caio 3D.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013


"Se eu escrevesse um diário íntimo, naturalmente rabiscaria hoje uma página assim: Registro a entrada de um gato em minha vida. [...] Chama-se José, nome que sempre dou a homens de bem. [...] Podeis chegar, inverno, chuvas, umidade, frio: Estou muito ocupada agora com o futuro de José. Quero vê-lo crescer, quero senti-lo forte. José e seu futuro são duas boas, puras e leais companhias".

Eneida de Moraes. Meu amigo José. In: Aruanda.
"Podem os homens vir que
Não vão me abalar
Os cães farejam o medo,
Logo não vão me encontrar"


O Rapa. Me Deixa

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

"Só agora reparei na falta que a família faz aos domingos
(...)
Por que se agitam tanto os chinelos aos domingos? Dia para subúrbio e províncias, dia feliz para os que ainda moram em casas e possuem quintaizinhos. Domingo, que grande dia para se criar galinhas e olhar como estão crescendo as plantas; que vontade de possuir um roseira para regar e com ela namorar.
Faz falta uma família aos domingos. Devo ter tido dedos muito leves entre meus cabelos, em outros domingos, porque nesses dias minha cabeça deseja sempre idênticos afagos. Envelhecem tristes e sem domingos, os meus cabelos".


Eneida de Moraes. Pé de Cachimbo. In: Aruanda. 
"[...]
Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.

[...]"

Fernando Pessoa. Tabacaria. In: Quando fui outros. 
"[...]
Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);

[...]"

Fernando Pessoa. Tabacaria. In: Quando fui outros.
"[...]
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,

[...]"

Fernando Pessoa. Tabacaria. In: Quando fui outros.