"O teu cheiro persiste no meu corpo durante dias. Não tomo banho. Guardo, preservo, cheiro o cheiro do teu cheiro grudado no meu. E basta fechar os olhos para naufragar outra vez e cada vez mais fundo na tua boca"
Caio Fernando Abreu. Anotações sobre um amor urbano. In: Caio 3D.
terça-feira, 11 de outubro de 2011
segunda-feira, 10 de outubro de 2011
"Às vezes lembrava-se de uma assustadora canção desafinada de meninas brincando de roda de mãos dadas - ela só ouvia sem participar porque a tia a queria para varrer o chão. [...] Pálida e mortal a moça era hoje o fantasma suave e terrificante de uma infância sem bola nem boneca. Então costumava fingir que corria pelos corredores de boneca na mão atrás de uma bola rindo muito. A gargalhada era aterrorizadora porque acontecia no passado e só na imaginação maléfica e trazida para o presente, saudade do que poderia ter sido e não foi".
Clarice Lispector. A Hora da Estrela.
sexta-feira, 7 de outubro de 2011
"Apóia o corpo na janela. Acende um cigarro. Espia a rua, as pessoas, a noite que se cumpre mais uma vez. Liga o rádio. Não ouve a música. Os olhos se turvam, por dentro uma coisa aperta num jeito de quem estrangula. Não pode gritar. As paredes se dobram fremem, prenhes de ironia.
Suspira. Exausto."
Caio F. Abreu. In: O essencial da década de 70.
Nesta cidade do Rio,
de dois milhões de habitantes,
estou sozinho no quarto,
estou sozinho na América.
[...]
de dois milhões de habitantes,
estou sozinho no quarto,
estou sozinho na América.
[...]
De dois milhões de habitantes!
E nem precisava tanto...
Precisava de um amigo,
desses calados, distantes,
que lêem verso de Horácio
mas secretamente influem
na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
e a essa hora tardia
como procurar amigo?
E nem precisava tanto...
Precisava de um amigo,
desses calados, distantes,
que lêem verso de Horácio
mas secretamente influem
na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
e a essa hora tardia
como procurar amigo?
[...]
Esta cidade do Rio!
Tenho tanta palavra meiga,
conheço vozes de bichos,
sei os beijos mais violentos,
viajei, briguei, aprendi.
Estou cercado de olhos,
de mãos, afetos, procuras.
Mas se tento comunicar-me
o que há é apenas a noite
e uma espantosa solidão.
Tenho tanta palavra meiga,
conheço vozes de bichos,
sei os beijos mais violentos,
viajei, briguei, aprendi.
Estou cercado de olhos,
de mãos, afetos, procuras.
Mas se tento comunicar-me
o que há é apenas a noite
e uma espantosa solidão.
[...]
Carlos Drummond Andrade. A Bruxa.
"Escrevo por não ter nada a fazer no mundo: sobrei e não há lugar para mim na terra dos homens. Escrevo porque sou um desesperado e estou cansado, não suporto mais a rotina de não ser, e se não fosse a sempre novidade que é escrever, eu me morreria simbolicamente todos os dias"
A Hora da Estrela. Clarice Lispector.
"É verdade, meu amigo, que cada dia compreendo melhor quão insensato é vivermos julgando os outros. De minha parte, tenho tanto que fazer para modificar-me a mim mesmo, tanto esfôrço a despender para acalmar as tempestades do meu coração!...Ah! Eu deixarei de bom grado que os outros façam o que bem entendam, contanto que êles me deixem fazer o mesmo"
Os Sofrimentos do Jovem Werther. Goethe.
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